Os Mais Belos Sonetos

Coletânea de sonetos escritos por poetas brasileiros, lusos e de outros paises

Afonso Lopes Vieira

Choram ainda a tua morte escura
Aquelas que chorando a memoraram;
As lágrimas choradas não secaram
Nos saudosos campos da ternura.

Santa entre as santas pela má ventura,
Rainha mais que todas que reinaram;
Amada, os teus amores não passaram,
E és sempre bela e viva e loura e pura.

Ó linda, sonha aí, posta em sossego
No teu moimento de alva pedra fina,
Como outrora na fonte do Mondego.

Dorme, sombra de graça e de saudade,
Colo de garça, amor, moça, menina,
Bem-amada por toda a eternidade!

Conde de Monsaraz

Mandas-me, cumpro. Eu sou o autômato modesto
Que a tua mão dirige e o teu olhar fascina:
Prende-se a minha vida à curva purpurina
De tua boca e à luz do teu sorriso honesto.

Só quero o teu amor (profundo amor!); de resto,
Em nada penso e creio. É esta a minha sina;
Aos teus caprichos, flor, todo o meu ser se inclina,
Seguindo a sua lei traçada no teu gesto!

E nesta escravidão cujos grilhões abraço
E beijo tanta vez, alarga-se-me o espaço,
Em que ouço alegremente os rouxinóis cantar.

Eu fiz do meu segredo um cárcere risonho,
Oh! déspota gentil, embala-me este sonho
Olha-me, eu quero luz! fala-me, eu quero ar!

Martins Fontes

Quem serei? Quem sou eu? Não me conheço
e tu, meu sósia, te conheces já?
Estudaste a tua alma pelo avesso,
tua mortalidade que será?

Nota-me bem. Feito do mesmo gesso,
que o mesmo em tudo sejas. Oxalá!
E, sendo assim, contigo me pareço,
e, o que és, comigo se parecerá.

Verás, a olhar-me, tua imagem cara,
que a face é minha, mas o rosto é teu,
e a exatez a aparência desmascara.

Relembrarás alguém que ontem morreu,
e, reencarnando em mim, hoje te encara,
sem saber quem tu és, ou quem sou eu. 

Alphonsus de Guimaraens

É necessário amar... Quem não ama na vida?
Amar o sol e a lua errante! amar estrelas,
Ou amar alguém que possa em sua alma contê-las,
Cintilantes de luz, numa seara florida!

Amar os astros ou na terra as flores... Vê-las
Desabrochando numa ilusão renascida...
Como um branco jardim, dar-lhes na alma guarida,
E todo, todo o nosso amor para aquecê-las...

Ou amar os poentes de ouro, ou o luar que morre breve,
Ou tudo quanto é som, ou tudo quanto é aroma...
As mortalhas do céu, os sudários de neve!

Amar a aurora, amar os flóreos rosicleres,
E tudo quanto é belo e o sentido nos doma!
Mas, antes disso, amar as crianças e as mulheres...

Virgínia Vitorino

"Fala comigo, amor. Conta-me tudo:"
Assim dizia a tua linda carta.
As saudades que sofre quem se aparta!
E como eu sou feliz, porque me iludo!

Custou-me que partisses. E, contudo,
murmurei ao sabê-lo: "Pois que parta.
Se o cansei, também eu me sinto farta.
E, se mudar, então também eu mudo."

Foste... Escreves... São raras as verdades...
E contas-me sem sombra de saudades:
"Passeio... mato o tempo, assim... assim..."

Comigo quase o mesmo se está dando:
mas, em vez de ser eu que o vou matando,
o tempo é que me vai matando a mim...

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