Os Mais Belos Sonetos

Coletânea de sonetos escritos por poetas brasileiros, lusos e de outros paises

Luís Guimarães Júnior

Tu és famosa, ó bela, és celebrada
Como as deusas de Lesbos e de Atenas;
És a rival das lúbricas Helenas,
És a moderna Aspásia idolatrada;

Sobre essa boca úmida e culpada
Folgam do Gozo as imortais falenas;
És o tesouro das gostosas penas
Que cega e atrai a alma escravizada;

Rola a teus pés o cofre da opulência,
Um teu sorriso é da fortuna a origem,
Um teu aceno arrasta a consciência:

No entanto, às vezes, uma atroz vertigem...
- “É que nesse momento a Providência
Vara-me a alma com um olhar de virgem!”

Luís Guimarães Júnior

É meia noite. O hino funerário
Das doze angústias voa doloroso
Entre os raios da lua, e majestoso
Rodeia a cruz do velho campanário.

Tudo é silente. O espectro solitário
Do remorso e do amor paira onduloso
Nas mudas trevas, - arrastando um gozo,
Ou as medonhas fímbrias de um sudário.

Mas o Poeta, erguendo a fronte ousada,
Faiscante de límpida alegria
E de virentes ilusões ornada,

Ouve a sorrir a lúgubre elegia,
Pois em sua alma ardente e deslumbrada
Jorra em ondas de luz: - é meio dia!

Aníbal Teófilo

Em solitária, plácida cegonha.
imersa num cismar ignoto e vago,
num fim de ocaso, à beira azul de um lago,
sem tristeza, quem há que os olhos ponha?

Vendo-a, Senhora, vossa mente sonha.
Talvez que o conde de um palácio mago
loura fada perversa, em tredo afago,
mudou nessa pernalta erma e tristonha.

Mas eu que, em prol da Luz, do pétreo e denso
véu do Ser ou Não-Ser, tento a escalada,
qual morosa, tenaz, paciente lesma,

Ao vê-la assim, mirar-se na água, penso
ver a Dúvida humana debruçada
sobre a angústia infinita de si mesma! 

Luís Guimarães Júnior

Quando eu contemplo os olhos teus, ó pura
Obra de Deus num dia abençoado,
Sinto que voo aos astros enlaçado,
Preso aos raios da tua formosura.

E uma gostosa e matinal frescura
Tal como um véu de beijos recamado,
Cobre o meu coração fanatizado,
Cego de amor e cego de ventura.

És como a Lua plácida e erradia:
Ao teu olhar meu coração ansioso,
Igual aos bosques quando expira o dia,

Repousa envolto num tremente gozo,
E a ti se eleva a minha poesia
Bem como a voz dum rouxinol medroso. 

Luís Guimarães Júnior

Vás para o baile, é hora: as flutuantes
Gazes te envolvem como as névoas puras
Que os astros vestem nas azuis alturas...
Vás coberta de gaze e de brilhantes;

E, enquanto espalhas graças deslumbrantes,
Repleta de opulência e de venturas,
Há um milhar de pobres criaturas,
Que se estorcem - na noite - agonizantes:

Moças sem pão, crianças magras, nuas,
Cujo suplício fora aliviado,
Se quisesses das pálidas mãos tuas,

Num santo gesto, rápido e ignorado,
Deixar cair na lama dessas ruas
Um alfinete só do teu toucado. 

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