Gregório de Matos
Ó tu do meu amor fiel traslado
Mariposa entre as chamas consumida,
Pois se à força do ardor perdes a vida,
A violência do fogo me há prostrado.
Tu de amante o teu fim hás encontrado,
Essa flama girando apetecida;
Eu girando uma penha endurecida,
No fogo que exalou, morro abrasado.
Ambos de firmes anelando chamas,
Tu a vida deixas, eu a morte imploro
Nas constâncias iguais, iguais nas chamas.
Mas ai! que a diferença entre nós choro,
Pois acabando tu ao fogo, que amas,
Eu morro, sem chegar à luz, que adoro.
Quem sou eu
- Carlos Arnaud de Carvalho
- São Domingos do Prata, Minas Gerais
- E nestas lutas vou cumprindo a sorte, até que venha a compassiva morte, levar-me à grande paz da sepultura.
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Juvenal Antunes
Acho tudo na vida duvidoso…
Duvido do que vi e tenho ouvido,
Da glória, do saber, da dor, do gozo,
Mesmo do teu amor, Laura, duvido.
Duvido do que é feio e o que é formoso,
Duvido do que leio e tenho lido,
E a duvidar, sem nunca ter repouso,
Em dúvidas cruéis ando perdido.
Confundo as ilusões com a realidade,
E o presente e o passado comparando,
Vejo a igualdade na desigualdade…
Duvido da mentira, quando minto,
E de todas as coisas duvidando
Duvido até das dúvidas que sinto!
Cecília Meireles
Trabalhei, sem revoltas nem cansaços,
no infecundo amargor da solitude:
as dores, - embalei-as nos meus braços,
como alguém que embalasse a juventude...
Acendi luzes, desdobrando espaços,
aos olhos sem bondade ou sem virtude;
consolei mágoas, tédios e fracassos
e fiz, a todos, todo o bem que pude!
Que o sonho deite bênçãos de ramagens
e névoas soltas de distância e ausência
na minha alma, que nunca foi feliz.
Escondendo-me as tácitas voragens
de males que me deram, sem consciência,
pelos míseros bens que sempre fiz!...
Alphonsus de Guimaraens
Celeste… É assim, divina, que te chamas.
Belo nome tu tens, Dona Celeste…
Que outro terias entre humanas damas,
Tu que embora na terra do céu vieste?
Celeste… E como tu és do céu não amas:
Forma imortal que o espírito reveste
De luz, não temes sol, não temes chamas,
Porque és sol, porque és luar, sendo celeste.
Incoercível como a melancolia,
Andas em tudo: o sol no poente vasto
Pede-te a mágoa do findar do dia.
E a lua, em meio à noite constelada,
Pede-te o luar indefinido e casto
Da tua palidez de hóstia sagrada.