Augusto dos Anjos
Conheci-o: era um padre, um desses santos
Sacerdotes da Fé de crença pura,
Da sua fala na eternal doçura
Falava o coração. Quantos, oh! Quantos
Ouviram dele frases de candura
Que de infelizes enxugavam prantos!
E como alegres não ficaram tantos
Corações sem prazer e sem ventura!
No entanto dizem que este padre amara.
Morrera um dia desvairado, estulto,
Sua alma livre para o Céu se alara.
E Deus lhe disse: "És duas vezes santo,
Pois se da Religião fizeste culto,
Foste do amor o mártir sacrossanto."
Quem sou eu
- Carlos Arnaud de Carvalho
- São Domingos do Prata, Minas Gerais
- E nestas lutas vou cumprindo a sorte, até que venha a compassiva morte, levar-me à grande paz da sepultura.
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Há de ser uma estrada de amarguras
a tua vida. E andá-la-ás sozinho,
vendo sempre fugir o que procuras
disse-me um dia um pálido advinho.
No entanto, sempre hás de cantar venturas
que jamais encontraste... O teu caminho,
dirás que é cheio de alegrias puras,
de horas boas, de beijos, de carinho..."
E assim tem sido... Escondo os meus lamentos:
É meu destino suportar sorrindo
as desventuras e os padecimentos.
E no mundo hei de andar, neste desgosto,
a mentir ao meu íntimo, cobrindo
os sinais destas lágrimas no rosto!
Machado de Assis
Querida, ao pé do leito derradeiro
Em que descansas dessa longa vida,
Aqui venho e virei, pobre querida,
Trazer-te o coração do companheiro.
Pulsa-lhe aquele afeto verdadeiro
Que, a despeito de toda a humana lida,
Fez a nossa existência apetecida
E num recanto pôs um mundo inteiro.
Trago-te flores, restos arrancados
Da terra que nos viu passar unidos
E ora mortos nos deixa e separados.
Que eu, se tenho nos olhos malferidos
Pensamentos de vida formulados,
São pensamentos idos e vividos.
Guilherme de Almeida
Essa que eu hei de amar perdidamente um dia,
será tão loura, e clara, e vagarosa, e bela,
que eu pensarei que é o sol que vem, pela janela,
trazer luz e calor a esta alma escura e fria.
E, quando ela passar, tudo o que eu não sentia
da vida há de acordar no coração, que vela...
E ela irá como o sol, e eu irei atrás dela
como sombra feliz... Tudo isso eu me dizia,
quando alguém me chamou. Olhei: um vulto louro,
e claro, e vagaroso, e belo, na luz de ouro
do poente, me dizia adeus, como um sol triste...
E falou-me de longe: "Eu passei a teu lado,
mas ias tão perdido em teu sonho dourado,
meu pobre sonhador, que nem sequer me viste!"