Os Mais Belos Sonetos

Coletânea de sonetos escritos por poetas brasileiros, lusos e de outros paises

Adelmar Tavares

Ela não viu a imagem na corrente,
quando ao rio, em S. João, se foi banhar,
e voltou para casa, descontente,
com os lindos olhos baixos, a chorar...

"Morrerei o outro Junho, certamente...
Como as "sortes" enganam!... "Vais casar" .
— Prima Amparo, não creia... Pode a gente
nessas superstições acreditar?...

O outro Junho chegou... E ela partia
morta, no seu caixão, magoado o rosto,
o meu primeiro amor, a flor de um dia!...

Por isso, quando Junho vem chegando,
choro esse esquife azul, pelo sol posto,
com seis moças de branco, carregando...

Gregório de Matos

Meu Deus, que estais pendente de um madeiro,
Em cuja lei protesto de viver,
Em cuja santa lei hei de morrer,
Animoso, constante, firme e inteiro:

Neste lance, por ser o derradeiro,
Pois vejo a minha vida anoitecer;
É, meu Jesus, a hora de se ver
A brandura de um Pai, manso Cordeiro.

Mui grande é o vosso amor e o meu delito;
Porém pode ter fim todo o pecar,
E não o vosso amor que é infinito.

Esta razão me obriga a confiar,
Que, por mais que pequei, neste conflito
Espero em vosso amor de me salvar.

Augusto dos Anjos

Homem, carne sem luz, criatura cega.
Realidade geográfica infeliz,
O Universo calado te renega
E a tua própria boca te maldiz!

O nôumeno e o fenômeno, o alfa e o omega
Amarguram-te. Hebdômadas hostis
Passam... Teu coração se desagrega,
Sangram-te os olhos, e, entretanto, ris!

Fruto injustificável dentre os frutos,
Montão de estercorária argila preta,
Excrescência de terra singular.

Deixa a tua alegria aos seres brutos,
Porque, na superfície do planeta,
Tu só tens um direito: o de chorar!

Auta de Souza

Quis visitar-te o anônimo jazigo
Em que a humildade em paz se nos revela,
Contemplo a cruz, antiga sentinela,
Erguida ao lado de um cipreste amigo.

Busco a memória e vejo-te comigo;
Estamos sob o verde da aquarela,
Teu sorriso na túnica singela
É luz brilhando neste doce abrigo.

Recordo o ouro, Mãe, que não quiseste,
Subindo para os sóis do lar Celeste
Para ensinar as trilhas da ascensão.

Venho falar-te, em prece enternecida,
Do amor imenso que me deste à vida,
Nas saudades sem fim do coração.

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