Os Mais Belos Sonetos

Coletânea de sonetos escritos por poetas brasileiros, lusos e de outros paises

Mário Beirão

Teus olhos de tão mística elegia,
resplandecentes de penumbra viva,
Perdem-se em mim: do meu olhar deriva
A luz da mais cristã melancolia!

Possa eu viver em ti, nessa harmonia
De memorante paz meditativa;
Minha alma da tua alma se cativa,
Aspira o teu silêncio que inebria!

Teu vulto no Ar imprime-se em debuxos
De recortada flor; visões perpassam
Noturnamente nos teus olhos bruxos!

Uma fonte discorre outonos tristes;
Caem flores do Céu; almas esvoaçam;
Estendo as mãos… adeus! Já não existes!

Auta de Souza

Num dia turvo assim foi que partiste
Cheio de dor e de tristeza cheio.
Eu fiquei a chorar num doido anseio
Olhando o espaço merencório, triste.

Não sei se mágoa mais profunda existe
Que esta saudade que me oprime o seio,
Pois a amargura que ferir-me veio
Naquele dia, ó meu irmão! persiste.

Os anos que se foram! Entanto, eu cismo
A todo o instante, no profundo abismo
Que veio a morte entre nós dois abrir.

Mas cada noite, na asa de uma prece,
Ou num raio de sol quando amanhece,
Vejo tua alma para o céu subir…

Cruz e Sousa

Há certas almas vãs, galvanizadas
De emoção, de pureza, de bondade,
Que como toda a azul imensidade
Chegam a ser de súbito estreladas.

E ficam como que transfiguradas
Por momentos, na vaga suavidade
De quem se eleva com serenidade
Às risonhas, celestes madrugadas.

Mas nada às vezes nelas corresponde
Ao sonho e ninguém sabe mais por onde
Anda essa falsa e fugitiva chama…

É que no fundo, na secreta essência,
Essas almas de triste decadência
São lama sempre e sempre serão lama.

Teixeira de Pascoaes

Sinto que, às vezes, choras, minha Irmã,
No teu sombrio quarto recolhida…
É que ela vem rompendo a sombra vã
Da Morte, e lhe aparece à luz da vida!

E aflita, como choras, minha Irmã…
Teu chôro é tua voz emudecida,
Ante a imagem da Filha, essa manhã
Em profunda saudade amanhecida.

Silêncio! Não palpites, coração;
Nem canto de ave ou mística oração
Um tal idílio venha perturbar!

Deixai a Filha amada e a Mãe saudosa:
A Filha a rir, de face carinhosa,
E a Mãe, tão triste e pálida, a chorar…

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