Os Mais Belos Sonetos

Coletânea de sonetos escritos por poetas brasileiros, lusos e de outros paises

Augusto dos Anjos

Morri! E a Terra - a mãe comum - o brilho
Destes meus olhos apagou!... Assim
Tântalo, aos reais convivas, num festim,
Serviu as carnes do seu próprio filho!

Por que para este cemitério vim?!
Por quê?! Antes da vida o angusto trilho
Palmilhasse, do que este que palmilho
E que me assombra, porque não tem fim!

No ardor do sonho que o fronema exalta,
Construí de orgulho ênea pirâmide alta,
Hoje, porém, que se desmoronou.

A pirâmide real do meu orgulho,
Hoje que apenas sou matéria e entulho
Tenho consciência de que nada sou!

Raimundo Correia

Este o país ideal que em sonhos douro;
Aqui o estro das aves me arrebata,
E em flores, cachos e festões, desata
A Natureza o virginal tesouro;

Aqui, perpétuo dia ardente e louro
Fulgura; e, na torrente e na cascata,
A água alardeia toda a sua prata,
E os laranjais e o sol todo o seu ouro...

Aqui, de rosas e de luz tecida,
Leve mortalha envolva estes destroços
Do extinto amor, que inda me pesam tanto;

E a terra, a mãe comum, no fim da vida,
Para a nudeza me cobrir os ossos,
Rasgue alguns palmos do seu verde manto.

Luís Delfino

Por ti a dor somente hoje conheço.
Como por ti me vem toda a alegria,
Quando canta por cima do teu beiço
Agora o riso, agora a luz do dia.

Dantes homem eu era; - sofreria:
Mas depois, que te vi, e amei, esqueço
Se há na terra soluços de agonia;
Para gozar-te, Amor, aos teus pés desço.

Quando ao colo te aperto, o mais olvido:
E é tal a ebriez a ter-te encadeada,
Que a vir um culto dar-te, a Deus convido:

Porque é minha alma em ti a luz ideada,
Porque o mais tudo é fugitivo ruído:
Tudo, Helena, sem ti, que vale? - Nada...

Florbela Espanca

Eu trago-te nas mãos o esquecimento
Das horas más que tens vivido, Amor!
E para as tuas chagas o unguento
Com que sarei a minha própria dor.

Os meus gestos são ondas de Sorrento...
Trago no nome as letras de uma flor...
Foi dos meus olhos garços que um pintor
Tirou a luz para pintar o vento...

Dou-te o que tenho: o astro que dormita,
O manto dos crepúsculos da tarde,
O sol que é d'oiro, a onda que palpita.

Dou-te comigo o mundo que Deus fez!
- Eu sou Aquela de quem tens saudade,
A Princesa do conto: “Era uma vez...”

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