Os Mais Belos Sonetos

Coletânea de sonetos escritos por poetas brasileiros, lusos e de outros paises

Alphonsus de Guimaraens

Quando te fores, branca, de mãos postas,
E me deixares neste vale de pranto,
Deitada assim, como as demais, de costas
Sobre o teu leve esquife de pau-santo:

Quando as rosas dos seios, decompostas,
Vierem causar à própria morte espanto,
E nessas tábuas vis, onde te encostas,
Te for o lodo o derradeiro manto:

Ainda hei de ver as lúcidas violetas
Que floriram no teu olhar incerto,
Por sob as tuas sobrancelhas pretas...

Ai! como Inês tu não serás rainha:
Mas amada hás de ser no céu decerto
Porque na terra nunca foste minha... 

Corrêa de Araújo

Desfila a procissão... Entre fulgores
Dourados, já declina o sol no poente...
No andor, ornado de ouropéis e flores,
Vai a Santa levada triunfalmente...

Vendo a imagem sagrada, indiferente
Da turba, em roda, aos místicos fervores,
Recordo Essa que adoro doidamente,
Essa por quem enlouqueci de amores.

Meus sonhos junto dela, eram dispersos...
Exibo-a pelas ruas, noite e dia,
Num belo andor, aos ombros dos meus versos.

Alto proclamando-lhe a beleza e a graça...
E em vão! É tudo em vão! Ela é mais fria
Que esta Santa de mármore que passa!...

Alphonsus de Guimaraens

Bendita sois entre as mulheres! Puras
Irradiações de salmos encantados
De glória a ti, Senhora, nas alturas,
Por séculos de séculos sagrados.

Vejo, no entanto, as tuas Amarguras...
Senhora, que há de ser dos desgraçados,
Se tu, a mais feliz das criaturas,
Tens olhos em lágrimas banhados?

Feliz, bem sei, pois és quem Deus mais ama...
Donde me vem que a Mãe do Verbo eterno
Me venha a mim? Santa Isabel exclama.

Passa-te na Alma a inspiração sublime:
E dos teus lábios desce o brando e terno
Hino que a glória da tua Alma exprime...

Gonçalves Crespo

Era austero e sisudo; não havia
Frade mais exemplar nesse convento:
No seu cavado rosto macilento
Um poema de lágrimas se lia.

Uma vez que na extensa livraria
Folheava o triste um livro pardacento,
Viram-no desmaiar, cair do assento,
Convulso, e torvo sobre a lágea fria.

De que morrera o venerando frade?
Em vão busco as origens da verdade,
Ninguém mais disse, explique-a quem puder.

Consta que um bibliófilo comprara
O livro estranho e que, ao abri-lo, achara
Uns dourados cabelos de mulher... 

Alphonsus Guimaraens

Voltas a ser de novo aquilo que tu eras.
A evocadora palidez do teu semblante
Faz-me pensar nas Virgens-Monjas de outras eras,
Quando de nós estava o Céu menos distante.

Na áurea correspondência estelar das esferas
A tua Alma nupcial há de passar triunfante.
O teu olhar reflete, entre vagas quimeras,
O Inferno, o Purgatório e o Paraíso de Dante.

Havia tal palidez ao redor do teu vulto,
Que eu disse ao ver-te aqui, nas terrenas idades:
O teu corpo já esteve entre flores sepulto...

Nesses restos de vida arde um fogo celeste:
Passam no teu olhar as longínquas saudades
Do esquife que deixaste ou do Céu de onde vieste...

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