Augusto dos Anjos
Bebi! Mas sei por que bebi!... Buscava
Em verdes nuanças de miragens, ver
Se nesta ânsia suprema de beber,
Achava a Glória que ninguém achava!
E todo o dia então eu me embriagava
- Novo Sileno, - em busca de ascender
A essa Babel fictícia do Prazer
Que procuravam e que eu procurava.
Trás de mim, na atra estrada que trilhei,
Quantos também, quantos também deixei,
Mas eu não contarei nunca a ninguém.
A ninguém nunca eu contarei a história
Dos que, como eu, foram buscar a Glória
E que, como eu, irão morrer também.
Quem sou eu
- Carlos Arnaud de Carvalho
- São Domingos do Prata, Minas Gerais
- E nestas lutas vou cumprindo a sorte, até que venha a compassiva morte, levar-me à grande paz da sepultura.
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Vicente de Carvalho
Ela é tão meiga! Em seu olhar medroso
Vago como os crepúsculos do estio,
Treme a ternura, como sobre um rio
Treme a sombra de um bosque silencioso.
Quando, nas alvoradas da alegria,
A sua boca úmida floresce,
Naquele rosto angelical parece
Que é primavera, e que amanhece o dia.
Um rosto de anjo, límpido, radiante…
Mas, ai! sob esse angélico semblante
Mora e se esconde uma alma de mulher
Que a rir-se esfolha os sonhos de que vivo
- Como atirando ao vento fugitivo
As folhas sem valor de um malmequer…
Augusto dos Anjos
E eu disse – Vai-te, estrela do Passado!
Esconde-te no Azul da Imensidade,
Lá onde nunca chegue esta saudade,
- A sombra deste afeto estiolado.
Disse, e a estrela foi para o Céu subindo,
Minh'alma que de longe a acompanhava,
Viu o adeus que do Céu ela enviava,
E quando ela no Azul foi-se sumindo
Surgia a Aurora – a mágica princesa!
E eu vi o Sol do Céu iluminando
A Catedral da Grande Natureza.
Mas a noite chegou, triste, com ela
Negras sombras também foram chegando,
E nunca mais eu vi a minha estrela!
Ivan Junqueira
E se eu disser que te amo – assim, de cara,
sem mais delonga ou tímidos rodeios,
sem nem saber se a confissão te enfara
ou se te apraz o emprego de tais meios?
E se eu disser que sonho com teus seios,
teu ventre, tuas coxas, tua clara
maneira de sorrir, os lábios cheios
da luz que escorre de uma estrela rara?
E se eu disser que à noite não consigo
sequer adormecer porque me agarro
à imagem que de ti em vão persigo?
Pois eis que o digo, amor. E logo esbarro
em tua ausência – essa lâmina exata
que me penetra e fere e sangra e mata.
Pe. Antônio Tomás
Eram-me as ilusões da mocidade,
Constelações de magna refulgência,
Que o céu da minha plácida existência
Vinham doirar de branda alacridade.
Apagou-as o tempo sem piedade,
Uma após outra, com brutal violência,
Deixando-me sem luz, sob a influência
Dos desenganos da senilidade.
Vejo agora, repleto de amargura,
Mudada em penas, a fugaz ventura
Desses momentos calmos e risonhos,
E para sempre extinta nas sombrias
E longas noites dos meus negros dias,
A via-láctea branca dos meus sonhos.