Os Mais Belos Sonetos

Coletânea de sonetos escritos por poetas brasileiros, lusos e de outros paises

Cruz e Sousa

Rola da luz do céu, solta e desfralda
Sobre ti mesma o pavilhão das crenças,
Constele o teu olhar essas imensas
Vagas do amor que no teu peito escalda.

A primorosa e límpida grinalda
Há de enflorar-te as amplidões extensas
Do teu pesar - há de rasgar-te as densas
Sombras - o véu sobre a luzente espalda…

Ainda não ri esse teu lábio rubro
Hoje - ainda na alma, nesse azul delubro
Não fulge o brilho que as paixões enastra;

Mas, amanhã, no sorridor noivado,
A vida triste por que tens passado,
De madressilvas e jasmins se alastra.

Cruz e Sousa

Pálida, bela, escultural, clorótica
Sobre o divã suavíssimo deitada,
Ela lembrava - a pálpebra cerrada -
Uma ilusão esplendida de ótica.

A peregrina carnação das formas,
- o sensual e límpido contorno,
Tinham esse quê de avérnico e de morno,
Davam a Zola as mais corretas normas!…

Ela dormia como a Vênus casta
E a negra coma aveludada e basta
Lhe resvalava sobre o doce flanco…

Enquanto o luar - pela janela aberta —
- como uma vaga exclamação - incerta
Entrava a flux - cascateado - branco!!… 

Alphonsus de Guimaraens

Que olhar de monja em longa penitência
O olhar daqueles olhos macerados!
Pairava-lhe talvez na morna essência
Uma alma carregada de pecados.

Para que mundos, para que existência,
Tão além desta vida, ei-los voltados!
Ó inacessível, mística dolência
De uns olhos a sonhar outros noivados...

Voz do passado, som que ressuscita!
Olhar tão cheio de palavras mortas
Daqui por certo que não pode ser...

Alma, para me ver, Alma bendita,
Põe-te de luto nessas duas portas
Com uma tristeza de quem vai morrer...

Cruz e Sousa

Olhos voltados para mim e abertos
Os braços brancos, os nervosos braços,
Vens de espaços estranhos, dos espaços
Infinitos, intérminos, desertos…

Do teu perfil os tímidos, incertos
Traços indefinidos, vagos traços
Deixam, da luz nos ouros e nos aços,
Outra luz de que os céus ficam cobertos.

Deixam nos céus uma outra luz mortuária,
Uma outra luz de lívidos martírios,
De agonies, de mágoa funerária…

E causas febre e horror, frio, delírios,
Ó Noiva do Sepulcro, solitária,
Branca e sinistra no clarão dos círios!

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