Os Mais Belos Sonetos

Coletânea de sonetos escritos por poetas brasileiros, lusos e de outros paises

Aníbal Teófilo

Em solitária, plácida cegonha,
Imersa num cismar ignoto e vago,
Num fim de ocaso, à beira azul de um lago,
Sem tristeza, quem há que os olhos ponha?

Vendo-a, Senhora, vossa mente sonha
Talvez, que o conde de um palácio mago,
Loura fada perversa, em tredo afago,
Mudou nessa pernalta erma e tristonha.

Mas eu, que em prol da Luz, do pétreo, denso
Véu do Ser ou Não Ser, tento a escalada
Qual morosa, tenaz, paciente lesma,

Ao vê-la assim mirar-se na água, penso
Ver a Dúvida Humana debruçada
Sobre a angústia infinita de si mesma.

Augusto dos Anjos

No tempo de meu Pai, sob estes galhos,
Como uma vela fúnebre de cera,
Chorei bilhões de vezes com a canseira
De inexorabilíssimos trabalhos!

Hoje, esta árvore de amplos agasalhos
Guarda, como uma caixa derradeira,
O passado da flora brasileira
E a paleontologia dos Carvalhos!

Quando pararem todos os relógios
De minha vida, e a voz dos necrológios
Gritar nos noticiários que eu morri,

Voltando à pátria da homogeneidade,
Abraçada com a própria Eternidade,
A minha sombra há de ficar aqui!

Antero Bloem

Quando depões sobre o teu Cristo amado,
- Esse Cristo que pende de teu peito,
Ungido de ternura e de respeito -
Um beijo de teu lábio imaculado,

Eu, sacrílego, sinto-me levado
- Ou seja por inveja, ou por despeito -
A arrebatar o Cristo do teu peito
E em teu peito morrer crucificado.

Mas quando vejo, do teu lábio crente,
Cair sobre Jesus a prece ardente,
Talvez por nosso amor, talvez por mim,

Ardo na chama intensa dos desejos
De, arrependido, sufocar meus beijos
Nesse teu alvo Cristo de Marfim. 

Augusto dos Anjos

Das trombetas proféticas o alarde
Falou-lhe, por seus onze augúrios certos:
“É maldito o teu nome! E aos céus abertos,
Não há divina proteção que o guarde!”

Dúvidas cruéis! Momentos cruéis! Incertos
E cruéis momentos! Ânsias cruéis! E, à tarde,
Saiu aos tombos, como um cão covarde,
A percorrer desertos e desertos...

E, assombrado, com medo do Infinito,
Por toda a parte, onde, aos tropeços, ia,
Por toda a parte viu seu nome escrito!

Vieram-lhe as ânsias. Teve sede e fome...
E foi assim que ele morreu um dia
Amaldiçoado pelo próprio nome!

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