Os Mais Belos Sonetos

Coletânea de sonetos escritos por poetas brasileiros, lusos e de outros paises

out
29

Juvenal Antunes

Eu vou-me embora antes que chova. E ela,
que perto dele estar sempre queria,
o espaço olhou com expressão singela...
nem uma nuvem pelo espaço havia

De quando em quando na azulada tela
uma estrela, luzindo, aparecia.
Fora, talvez, para ofendê-la, aquela
frase cruel que tanto lhe doía

Fora de certo. Não valia a pena
amá-lo tanto. Louca! Ela o condena
e olhando o céu como implorando calma

viu mais estrelas pelo céu fulgindo,
qual se estivessem murmurando e rindo
da tempestade enorme de sua alma.

out
22

Luís Guimarães Júnior

Como é ligeiro o esquife perfumado
Que conduz o teu corpo, ó flor mimosa!
Mal pousaste entre nós, alma saudosa,
Pouco adejaste, ó querubim nevado!

E vás descendo ao túmulo sagrado,
Igual à incauta e leve mariposa
Que sem sentir queimou a asa ansiosa
Do mundo vil no fogo profanado.

Mas eu, que acabo de te ver perdida
Nos abismos sem fim da Natureza,
Ó minha filha! Ó terna flor caída.

Eu, que perdi contigo a fortaleza,
As ilusões, o gozo, a crença e a vida,
Ah! Eu bem sei quanto esse esquife pesa!

out
15

Augusto dos Anjos

A Dor meu coração torça e retorça
E me retalhe como se retalha
Para escárnio e alegria da canalha
Um leão vencido que perdeu a força!

Sobre mim caia essa vingança corsa,
Já que perdi a última batalha!
E, enquanto o Tédio a carne me trabalha,
A Dor meu coração torça e retorça!

Cubra-me o corpo a podridão dos trapos!
Os vibriões, os vermes vis, os sapos
Encontrem nele pábulo eviterno...

- Repositório de milhões de miasmas
Onde se fartem todos os fantasmas,
Primavera, verão, outono, inverno!

out
08

Pe. Antônio Tomás

Tive sonhos azuis, na mocidade,
Que vinham, como pássaros em festa,
Encher-me o seio – um canto de floresta –
De gratos sons, de viva alacridade.

Mas um dia a cruel realidade
Pôs-lhes em cima a rude mão funesta
E exterminou-os... Nenhum mais me resta
Na minha negra e triste soledade.

Hoje o meu seio inerte, mudo e frio,
Se converte em túmulo sombrio
Por sobre o qual gementes e tristonhos,

Alvejantes fantasmas se debruçam:
São as meigas saudades que soluçam
Sobre o jazigo eterno dos meus sonhos.

out
01

Artur de Sales

Na silenciosa catedral vetusta
Penetrei; religioso e solitário,
Numa concentração de missionário
Sublimizado numa fé robusta.

De um Cristo macilento e funerário,
Braços abertos sobre a cruz adusta,
Vinha uma doce claridade augusta,
Que iluminava todo o santuário.

Aos pés da imagem do Crucificado
Chorei, por muito tempo, ajoelhado;
Mas, quando o olhar ergui, tremi de espanto:

Do altar, por entre as sombras, fugidias,
— Oh! ironia atroz das ironias! —
Aquele Cristo ria do meu pranto...

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