Os Mais Belos Sonetos

Coletânea de sonetos escritos por poetas brasileiros, lusos e de outros paises

Euclides da Cunha

Ontem — quando, soberba, escarnecias
Dessa minha paixão — louca — suprema
E no teu lábio, essa rósea algema,
A minha vida — gélida — prendias...

Eu meditava em loucas utopias,
Tentava resolver grave problema...
Como engastar tua alma num poema?
E eu não chorava quando tu te rias...

Hoje, que vivo desse amor ansioso
E és minha — és minha, extraordinária sorte,
Hoje eu sou triste sendo tão ditoso!

E tremo e choro — pressentindo — forte,
Vibrar, dentro em meu peito, fervoroso,
Esse excesso de vida — que é a morte...

Artur Azevedo

Quando me esperas, palpitando amores,
e os lábios grossos e úmidos me estendes,
e do teu corpo cálido desprendes
desconhecido olor de estranhas flores;

quando, toda suspiros e fervores,
nesta prisão de músculos te prendes,
e aos meus beijos de sátiro te rendes,
furtando às rosas as purpúreas cores;

os olhos teus, inexpressivamente,
entrefechados, lânguidos, tranquilos,
olham, meu doce amor, de tal maneira,

que, se olhassem assim, publicamente,
deveria, perdoa-me, cobri-los
uma discreta folha de parreira.

Cruz e Sousa

Dor, és tu que resgatas, que redimes
Os grandes réus, os míseros culpados,
Os calcetas dos erros, dos pecados,
Que surgem do pretérito de crimes.

Sob os teus pulsos, fortes e sublimes,
Sofri na Terra junto aos condenados,
Seres escarnecidos, torturados,
Entre as prisões da Lágrima que exprimes!

Da perfeição és o sagrado Verbo,
Ó portadora do tormento acerbo,
Aferidora da Justiça Extrema...

Bendita a hora em que me pus à espera
De ser, em vez do réprobo que eu era,
O missionário dessa Dor suprema!

Machado de Assis

Maria, há no seu gesto airoso e nobre,
Nos olhos meigos e no andar tão brando,
Um não sei quê suave que descobre,
Que lembra um grande pássaro marchando.

Quero, às vezes, pedir-lhe que desdobre
As asas, mas não peço, reparando
Que, desdobradas, podem ir voando
Levá-la ao teto azul que a terra cobre.

E penso então, e digo então comigo:
"Ao céu que vê passar todas as gentes
Bastem outros primores de valia.

Pássaro ou moça, fique o olhar amigo,
O nobre gesto e as graças excelentes
Da nossa cara e lépida Maria".

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