Os Mais Belos Sonetos

Coletânea de sonetos escritos por poetas brasileiros, lusos e de outros paises

Alvarenga Peixoto

Amada filha, é já chegado o dia,
em que a luz da razão, qual tocha acesa
vem conduzir a simples natureza,
é hoje que o teu mundo principia.

A mão que te gerou teus passos guia,
despreza ofertas de uma vã beleza,
e sacrifica as honras e a riqueza
às santas leis do filho de Maria.

Estampa na tua alma a caridade,
que amar a Deus, amar aos semelhantes,
são eternos preceitos da verdade.

Tudo o mais são idéias delirantes;
procura ser feliz na eternidade,
que o mundo são brevíssimos instantes.

Florbela Espanca

Sonho que sou a Poetisa eleita,
Aquela que diz tudo e tudo sabe,
Que tem a inspiração pura e perfeita,
Que reúne num verso a imensidade!

Sonho que um verso meu tem claridade
Para encher todo o mundo! E que deleita
Mesmo aqueles que morrem de saudade!
Mesmo os de alma profunda e insatisfeita!

Sonho que sou Alguém cá neste mundo...
Aquela de saber vasto e profundo,
Aos pés de quem a Terra anda curvada!

E quando mais no céu eu vou sonhando,
E quando mais no alto ando voando,
Acordo do meu sonho... E não sou nada!...

Hermes Fontes

Juro por tudo quanto é jura..,
juro por mim, por ti, por nós, por Jesus Cristo,
que hei-de esquecer-te! Vês? Estou seguro
contra o teu sólio, a cuja queda assisto.

E, visto que duvidas tanto, visto
que ris do que, solene, te asseguro,
juro mais: pelo ser em que consisto,
por meu passado, pelo teu futuro!

Pela Virgem Maria concebida,
pelas venturas de que vou no encalço,
por minha vida, pela tua vida...

Juro por tudo o que mais amo e exalço!
E depois de uma jura tão comprida,
juro... juro que estou jurando falso!!...

Ana Amélia

Toda pena de amor, por mais que doa,
no próprio amor encontra recompensa.
As lágrimas que causa a indiferença,
seca-as depressa uma palavra boa.

A mão que fere, o ferro que agrilhoa,
obstáculos não são que Amor não vença.
Amor transforma em luz a treva densa;
por um sorriso Amor tudo perdoa.

Ai de quem muito amar, não sendo amado,
e, depois de sofrer tanta amargura,
pela mão que o feriu não for curado...

Noutra parte há de, em vão, buscar ventura:
- fica-lhe o coração despedaçado,
que o mal de Amor só nesse Amor tem cura.

Mauro Mota

Insone e inquieta na pequena cama,
Na longa noite, Luciana chora,
E à mamãe tão distante chama, chama,
Como se ela pudesse ouvi-la agora.

Não quer o pai, não quer também sua ama;
Só a mãe que a deixou e foi embora.
No seu choro infantil, pede e reclama
A canção de dormir que ouvia outrora.

Mas, aos poucos, na noite, vejo-a calma,
Para alguém os seus braços se levantam,
Junto do berço, maternal, tua alma

Canta a canção de doces estribilhos
Que as mães, mesmo depois de mortas, cantam
Para embalar os pequeninos filhos.

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