Os Mais Belos Sonetos

Coletânea de sonetos escritos por poetas brasileiros, lusos e de outros paises

Raul de Leoni

As idéias são seres superiores,
- Almas recônditas de sensitivas -
Cheias de intimidades fugitivas,
De crepúsculos, melindres e pudores.

Por onde andares e por onde fores,
Cuidado com essas flores pensativas,
Que tem pólen, perfumes, órgãos e cores
E sofrem mais que as outras cousas vivas.

Colhe-as na solidão... são obras-primas
Que vieram de outros tempos e outros climas
Para os jardins de tua alma que transponho,

Para com ela teceres, na subida,
A coroa votiva do teu Sonho
E a legenda imperial da tua Vida.

Augusto dos Anjos

No mundo vago das idealidades
Afundei minha louca fantasia;
Cedo atraiu-me a auréola fulgidia
Da refulgência antiga das idades.

Mas ao esplendor das velhas majestades
Vacila a mente e o seu ardor esfria;
Busquei então na nebulosa fria
Das ilusões, sonhar novas idades.

Que desespero insano me apavora!
Aqui, chora um ocaso sepultado;
Ali, pompeia a luz da branca aurora.

E eu tremo entre um mistério escuro:
- Quero partir em busca do Passado,
- Quero correr em busca do Futuro.

Belmiro Braga

Cinquenta anos já fiz, e não fiz nada
neste meus longos cinquenta anos, feitos
de pesares, de angustias, de despeitos,
a boca sorridente e a alma enlutada.

A estrada do Dever foi minha estrada,
da Virtude segui os sãos preceitos,
e nem honras, nem glorias, nem proveitos
encontro ao fim da aspérrima jornada...

Vivi sonhando com manhãs radiosas,
com bosques verdes, pássaros e ninhos,
e deu-me a vida noites tormentosas,

e deu-me campos mortos e maninhos...
Cinquenta anos vivi semeando rosas,
cinquenta anos vivi colhendo espinhos...

José Mata Roma 

Conta uma lenda antiga, cuja fama
pelos tempos modernos inda voa,
que, lá no Inferno, condenado, à toa,
de fome e sede Tântalo rebrama.

Junto, corre uma fonte clara e boa;
perto, um galho de frutas se recama;
- mas, se ele quer comer, se afasta a rama;
E se tenta beber, a água se escoa!

Tem minha vida e a lenda o mesmo traço;
flagela-me também um vão desejo;
fome e sede incontidas também passo.

Punido como Tântalo me vejo:
- tão junto desse corpo, e não te abraço!
- tão perto dessa boca, e não te beijo!

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